Marina Gazire, uma das curadoras convidadas para Bienal fala sobre arte e hibridismos. Chris Vinti e Marcela Bueno da agência de inteligência digital vai formiga entrevistou a professora, crítica e curadora.
Qual a importância do hibridismo para a arte?
Podemos dizer que a arte é hibrida por natureza. Se pensarmos em seus processos históricos e nas origens da arte como categoria, ou seja, como um campo do conhecimento,descobrimos que esse entendimento é relativamente algo recente__ de 500 anos pra cá. Até o Renascimento a arte e a técnica (ou que chamamos hoje de tecnologia) não eram vistos de pontos separados. O próprio termo que dá origem a palavra arte e tecnologia em grego, Téchne, designava em sua etimologia ás práticas da arte, técnica e ofício. Acho que hibridismo é um retorno conceitual que somos obrigados a fazer nos dias de hoje por uma falta de memória e pela leitura que temos, de certa maneira, imposta a nós por uma ideologia modernista que durante muito tempo separou a arte em caixinhas: escultura, pintura, gravura, etc,- e também- a arte da própria tecnologia. A tecnologia foi aproximada do método cientifico e ambos os saberes foram colocados em uma relação polarizada nesse processo a que hoje chamamos de arte.
Com a arte digital, a ciência tem uma relação mais estreita com o painel criativo? Como essa relação acontece? Como a ciência se aproxima da arte digital?
Não acho que necessariamente a arte digital possua uma relação mais estreita com o criativo. O digital pode democratizar mais esses processos criativos até certo ponto, mas se pensamos criatividade do ponto de vista da inovação, a discussão ganha outro contexto, porque inovação é uma coisa cara do ponto de vista do capital e do consumo. Acho que a grande perspectiva que o digital nos trouxe foi essa, digamos, rememoração, do conceito que eu disse acima. De uma visão que se aproxima mais ao da Techné e que ajudou_ junto com outros inúmeros fatores sócio-culturais a partir do século XX _ a implodir modos de ver polarizados dentro dos campos da ciências, da filosofia e das artes. Um artista, pesquisa, desenvolve métodos, modelos, traduz e recria signos que estão (nem sempre) em uma outra ceara, que podem ser diferentes, por exemplo, dos resultados buscados por um modelo científico. Porém, ambas as práxis, compartilham e derivam conhecimentos sobre o mundo, produzem paradigmas. A arte pode ser mais poética, mas também pode ser científica: lembremos de casos como o azul de Klein, um pigmento de coloração espectral única desenvolvida por um artista (e nem estamos falando do digital aqui). E, consequentemente, há poética na ciência também. O que não podemos fazer é sermos reducionistas em relação ao impacto social do digital como mera ferramenta, porque em perspectiva, ele muda muito nossa relação cognitiva, econômica e social com o mundo.
O que a Bienal de Arte Digital pode trazer para o Brasil?
Acho que o mais importante da Bienal de Arte está na manutenção de uma visibilidade sobre que o vem acontecendo não só nos últimos dois anos, mas na arte desde o início do século 21. Uma reflexão sobre o digital no nosso contexto.
Dos fins dos anos 2000 pra cá vimos decair o acontecimento de festivais, curadorias e exposições que pensassem sobre a questão digital. Não é porque o digital agora é definitivamente ubíquo que fazer recortes e refletir criticamente sobre ele no campo da arte deve ser deixado de lado.